Consequências de trabalhar durante o seguro-desemprego


O seguro-desemprego é um dos principais direitos sociais no Brasil, concedido ao trabalhador formal que, após ser dispensado sem justa causa, fica temporariamente desprovido de renda.
Esse benefício é regulamentado pela Lei nº 7.998/1990 e pela Constituição Federal de 1988, com o objetivo de fornecer um alívio financeiro enquanto o trabalhador busca recolocação no mercado de trabalho.
Entretanto, as chamadas fraudes ao sistema, tal como o exercício de atividades remuneradas sem registro, por exemplo, podem acarretar graves consequências legais e sociais.
Este artigo abordará as implicações de trabalhar sem registro durante o recebimento do seguro-desemprego, incluindo os aspectos jurídicos, consequências criminais e a jurisprudência sobre o tema.
Conceito: O que é o Seguro-Desemprego?
O seguro-desemprego é um benefício temporário e de natureza assistencial. Ele visa amparar o trabalhador formal que foi dispensado involuntariamente, possibilitando que este tenha um período de subsistência enquanto procura por uma nova oportunidade de emprego.
O direito ao seguro-desemprego está previsto no artigo 7º, inciso II, da Constituição Federal de 1988, e regulamentado pela Lei nº 7.998/1990.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
A legislação define os requisitos para o recebimento, como o tempo mínimo de contribuição, e o número de parcelas a que o trabalhador tem direito, que varia de três a cinco, dependendo do tempo de serviço.
O benefício é destinado exclusivamente ao trabalhador que está temporariamente desempregado e não possui outra fonte de renda, sob pena de cancelamento.
Art. 3º, Lei nº 7.998/1990: Terá direito à percepção do seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove:
[...]
III - não estar em gozo de qualquer benefício previdenciário de prestação continuada, previsto no Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, excetuado o auxílio-acidente e o auxílio suplementar previstos na Lei nº 6.367, de 19 de outubro de 1976, bem como o abono de permanência em serviço previsto na Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973;
IV - não estar em gozo do auxílio-desemprego; e
V - não possuir renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família.
O trabalho sem registro e a configuração de fraude
O exercício de atividade remunerada sem registro durante o período de recebimento do seguro-desemprego é considerado uma violação das condições legais do benefício.
O trabalho sem registro — conhecido popularmente como "trabalho informal" — constitui uma irregularidade não só em relação às normas trabalhistas, mas também ao sistema de proteção social, configurando fraude ao seguro-desemprego.
O seguro-desemprego deve ser cessado se o trabalhador passar a desenvolver atividade profissional enquanto estiver recebendo as parcelas, e a omissão desta informação pode configurar fraude, nos termos do art. 8º da Lei nº 7.998/1990:
Art. 8º O benefício do seguro-desemprego será cancelado:
I - pela recusa por parte do trabalhador desempregado de outro emprego condizente com sua qualificação registrada ou declarada e com sua remuneração anterior;
II - por comprovação de falsidade na prestação das informações necessárias à habilitação
III - por comprovação de fraude visando à percepção indevida do benefício do seguro-desemprego; ou
IV - por morte do segurado.
Isso significa que, mesmo que o trabalhador esteja em situação de informalidade, exercendo uma atividade remunerada sem contrato formal, ele não pode continuar recebendo o benefício.
Exemplo Prático: Imagine que João foi dispensado de sua função como atendente em uma loja e passou a receber o seguro-desemprego. Durante o recebimento, ele começa a trabalhar informalmente em um restaurante, todos os dias e mediante salário fixo, mas sem carteira assinada. Ao não informar sua nova situação e continuar recebendo o benefício, João comete fraude. Caso essa atividade seja descoberta, ele será obrigado a restituir os valores recebidos e poderá enfrentar consequências criminais.
Consequências Jurídicas da Fraude
As fraudes relacionadas ao seguro-desemprego, principalmente quando há simultaneidade entre o recebimento do benefício e o exercício de atividade remunerada sem registro, acarretam sérias consequências tanto no âmbito civil quanto no penal.
Restituição dos Valores: Uma vez constatada a fraude, o trabalhador será obrigado a devolver todos os valores recebidos de forma indevida. Isso ocorre porque, legalmente, o seguro-desemprego só pode ser pago àqueles que efetivamente estejam desempregados e sem outra fonte de renda. A Resolução 467 CODEFAT/2005 estipula que:
Art. 21 – As parcelas do Seguro-Desemprego, recebidas indevidamente pelos segurados, serão restituídas mediante depósito em conta do Programa Seguro-Desemprego na Caixa Econômica Federal (CAIXA), exceto nos casos de restituição por determinação judicial que será efetuada mediante Guia de Recolhimento da União (GRU).
§ 1º – O valor da parcela a ser restituída será corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), a partir da data do recebimento indevido até a data da restituição.
§ 2º – O prazo para o segurado solicitar o reembolso de parcelas restituídas indevidamente será de 2 (dois) anos, contados a partir da data da efetiva restituição indevida.
Cancelamento Imediato do Benefício: Assim que for detectada a fraude, o pagamento das parcelas do seguro-desemprego será imediatamente cancelado. Isso inclui não apenas o encerramento das parcelas futuras, mas também a obrigatoriedade de devolução das já recebidas, conforme estipula a Lei nº 7.998/1990.
Implicações Criminais: A prática de fraudar o sistema pode ser enquadrada como estelionato, crime previsto no art. 171 do Código Penal. O estelionato é definido como a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo de outrem, mediante artifício ou fraude. No caso do seguro-desemprego, a fraude ao erário é caracterizada pela obtenção de benefício financeiro indevido em prejuízo do sistema público de assistência.
Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
A pena para o crime de estelionato pode variar de um a cinco anos de reclusão, além de multa, conforme a gravidade do caso. Tanto o trabalhador quanto o empregador podem ser responsabilizados criminalmente conforme o artigo 171 do Código Penal, e, em caso de condenação, estarão sujeitos à pena prevista no § 3º desse dispositivo legal.
É fundamental destacar que o direito ao recebimento do seguro-desemprego não é garantido apenas pela ausência de registro na CTPS, mas sim pela inexistência de trabalho e renda que assegurem o sustento do trabalhador e de sua família enquanto ele estiver desempregado. Dessa forma, comete o crime descrito o trabalhador que, enquanto está recebendo o seguro-desemprego, realiza atividade profissional.
Para evitar essa situação, o empregador deve registrar formalmente o trabalhador no momento da admissão, ainda que ele esteja recebendo seguro-desemprego. Da mesma forma, o trabalhador deve buscar regularizar sua situação e reingressar no mercado de trabalho de forma oficial assim que surgir uma oportunidade, deixando o benefício para aqueles que realmente precisam dele.
Entendimento dos tribunais
Os tribunais brasileiros têm sido firmes em relação à punição de fraudes no seguro-desemprego. A jurisprudência indica que, uma vez detectada a prática fraudulenta, os valores recebidos de forma indevida devem ser devolvidos integralmente, e o trabalhador pode responder criminalmente.
A jurisprudência do Superior Tribunal Justiça consolidou o entendimento de que a simples ausência de registro na CTPS não tem o condão de, por si só, comprovar a situação de desemprego do segurado, para os fins previstos no art. 15, § 2º, da Lei n. 8.213/1991.
Caso concreto: A fim de esclarecer como o entendimento acerca de fraudes relacionadas ao seguro-desemprego e trabalho sem registro está consolidado há bastante tempo, pode-se citar um caso que exemplifica essa prática, demonstrando a firme atuação do Judiciário. Em uma ação trabalhista, uma funcionária reconheceu em juízo que continuou a trabalhar sem registro após uma demissão fictícia, enquanto recebia o seguro-desemprego. A juíza responsável pelo caso, da 25ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (PJe: 0011309-12.2015.5.03.0025), determinou que o Ministério Público fosse notificado para as providências cabíveis, com base no artigo 40 do Código de Processo Penal.
A trabalhadora alegou não ter visto irregularidades em sacar o FGTS e solicitar o seguro-desemprego, porém essa justificativa não foi aceita, visto que ela deveria ter informado ao Ministério do Trabalho sua real condição. O caso foi enquadrado como potencial estelionato, conforme o artigo 171 do Código Penal, que prevê aumento de pena quando o crime envolve entidades públicas. Além disso, ficou determinado que a empresa corrigisse o registro da funcionária e cumprisse as obrigações da rescisão contratual.
O trabalho sem registro enquanto o trabalhador recebe seguro-desemprego configura fraude, gerando consequências graves tanto na esfera civil quanto penal. A devolução dos valores, o cancelamento do benefício e a possibilidade de responder por estelionato são apenas algumas das penalidades aplicáveis. Por isso, é fundamental que o trabalhador compreenda a importância de agir com transparência e seguir as normas estabelecidas pela legislação, evitando riscos desnecessários.
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