O que configura dano estético no direito médico?


Anteriormente vinculado ao dano moral, o dano estético passou a ter maior relevância e se diferenciou do dano moral, possuindo, atualmente, características próprias.
Dentre as principais características do dano estético, destacam-se as alterações físicas duradouras ou permanentes causadas por terceiro, que afetam a integridade da aparência da vítima, ainda que não sejam imediatamente visíveis.
Essas alterações podem comprometer a autoestima, dificultar a aceitação da própria imagem e gerar impactos negativos na sociabilidade, como constrangimento e isolamento.
A súmula 387 do STJ estabelece que é lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral. Este entendimento aplica-se mesmo quando os danos resultam do mesmo fato, desde que sejam passíveis de identificação autônoma. Os juízes e tribunais estaduais, por sua vez, também têm reconhecido que o dano estético, por se tratar de um prejuízo específico e autônomo, pode ser objeto de indenização cumulativa, desde que devidamente comprovado a causa, a deformação e a repercussão duradoura ou permanente na vida do ofendido.
Destarte, reforça-se o entendimento pátrio de que o dano estético vai além do dano moral, de forma que ambos poderão ser requeridos de forma conjunta em um mesmo processo (mas havendo diferenciação um do outro).
Diferença entres outros tipos de danos
No âmbito da responsabilidade civil, os danos indenizáveis se classificam, em regra, em dano material, dano moral e dano estético, cada um com características próprias e consequências jurídicas distintas.
O dano material corresponde à lesão ao patrimônio da vítima, envolvendo prejuízos econômicos efetivos, como despesas médicas, perda ou danos em bens, entre outros. Já o dano moral, refere-se à violação de direitos da personalidade, como a honra, a imagem, a dignidade e a integridade psíquica, ocasionando sofrimento, dor, angústia ou humilhação, independentemente de prejuízo financeiro. Por sua vez, o dano estético se caracteriza pela alteração duradoura ou permanente na aparência física da vítima, resultante de ato ilícito, que afeta a harmonia corporal ou a integridade visual, podendo repercutir na autoestima e na vida social do indivíduo.
Assim, os três tipos de dano, embora possam coexistir em um mesmo fato, são distintos quanto à natureza da lesão e ao aspecto da vida do ofendido que atingem. Essa distinção é fundamental para assegurar uma reparação justa e proporcional aos prejuízos sofridos pela vítima, considerando tanto os aspectos físicos quanto os psicológicos decorrentes do evento danoso.
Danos estéticos no direito médico
Como mencionado, a necessidade de uma indenização específica por dano estético surgiu diante do aumento de casos em que a lesão sofrida pela vítima apresentava características distintas do mero abalo moral.
A diferenciação se fez necessária, principalmente, em situações nas quais a vítima experimentava uma deformidade física visível ou permanente que afetava diretamente sua aparência, sem necessariamente causar sofrimento psíquico direto, típico do dano moral. Esse tipo de dano passou a ser reconhecido em diversas esferas, como no ambiente de trabalho, especialmente em acidentes laborais com mutilações ou cicatrizes permanentes, em acidentes de trânsito que resultam em sequelas físicas, e também no campo médico, em especial em procedimentos estéticos ou cirurgias mal executadas que comprometam a harmonia corporal do paciente.
A crescente valorização da estética, impulsionada pela mídia e redes sociais, tem levado um número significativo de pessoas a buscar procedimentos estéticos e cirurgias plásticas o que, em excesso, aumenta as chances de surgimento de danos.
Para que haja a responsabilização civil, é indispensável a comprovação do nexo causal entre a conduta do agente e o prejuízo sofrido, bem como a efetiva existência de um dano à aparência física que repercute negativamente na autoestima da vítima e em sua convivência social.
Assim, frustrações subjetivas com resultados estéticos abaixo da expectativa não bastam para reparação pecuniária, sendo necessária a demonstração de uma alteração física duradoura ou permanente que afete significativamente a imagem pessoal.
Jurisprudência sobre dano estético
Ao se analisar a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná, é possível identificar diversos casos em que o dano estético é objeto de discussão e reconhecimento judicial.
Tais julgados reforçam a consolidação do entendimento de que o dano estético possui características próprias e merece análise específica, distinta do dano moral ou material, a fim de garantir uma reparação justa e proporcional ao prejuízo sofrido. Como o exemplo os seguinte casos:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. ERRO MÉDICO. AUSÊNCIA DE REALIZAÇÃO DE EXAMES NO 1º ATENDIMENTO. FRATURA DO DEDO MÍNIMO DA MÃO DIREITA PERCEBIDA APÓS CERCA DE 1 MÊS DO ACIDENTE. CALCIFICAÇÃO ERRÔNEA DO OSSO, SEM POSSIBILIDADE DE REVERSÃO. ALEGAÇÃO DE DANO DECORRENTE DE MÁ CONDUTA MÉDICA. PEDIDOS JULGADOS PROCEDENTES. RECURSO DE APELAÇÃO DO RÉU. RECURSO ADESIVO DA AUTORA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO DE SENGÉS. CASO CLÍNICO INICIALMENTE ABORDADO DE FORMA CORRETA, CONFORME AS CONDUTAS INDICADAS NA ÉPOCA DO FATO. IMPOSSIBILIDADE DE SE VERIFICAR A LESÃO NO 1º ATENDIMENTO REALIZADO. LAUDO PERICIAL QUE DEMONSTRA AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE O DANO E A CONDUTA MÉDICA, BEM COMO DE COMPROMETIMENTOS FÍSICOS À AUTORA. AUSÊNCIA DE PROVA DE CONDUTA DO AGENTE PÚBLICO QUE TENHA COMPROVADO OS APONTADOS DANOS. ÔNUS DA PROVA DA AUTORA. REQUISITOS À RESPONSABILIDADE CIVIL DO RÉU NÃO IMPLEMENTADOS. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO DO RÉU PROVIDA. APELAÇÃO ADESIVA DA AUTORA PREJUDICADA.
(TJPR - 1ª Câmara Cível - 0001357-64.2021.8.16.0161 - Sengés - Rel.: DESEMBARGADOR LAURI CAETANO DA SILVA - J. 24.04.2025)
Observa-se nesse caso que a decisão reformou a sentença que havia julgado procedentes os pedidos, afastando a responsabilidade civil do município. A fundamentação se baseou na ausência de prova do nexo causal entre a conduta do profissional de saúde e os danos alegados.
Ainda, ficou demonstrado que não houve comprometimento funcional relevante nem deformidade estética significativa que justificasse reparação.
Esse caso reforça a necessidade de prova robusta para a caracterização do dano estético, é imprescindível demonstrar a conduta culposa, o nexo de causalidade e a existência de um dano efetivo e duradouro à aparência física, com impacto na autoestima e na convivência da vítima.
A simples frustração com o resultado ou a alegação de deformidade sem a respectiva comprovação objetiva não são suficientes para justificar a indenização.
Ainda, a perícia, nesses casos, é de suma importância para as partes:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E DANO ESTÉTICO DECORRENTE DE ERRO MÉDICO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO NOS PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. PRESUNÇÃO DE CULPA DO MÉDICO, A SER ELIDIDA SE COMPROVADA SITUAÇÃO EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA INOCORRÊNCIA DE ERRO MÉDICO PELA ADEQUAÇÃO DO PROCEDIMENTO ADOTADO PELO PROFISSIONAL E DA MEDICAÇÃO APLICADA. ALEGADA CULPA DO AUTOR/APELADO PELO RESULTADO NEGATIVO DO TRATAMENTO. PROVA DOS AUTOS QUE DEMONSTRAM A EXISTÊNCIA DO DANO RELACIONADO ÀS LESÕES E CICATRIZES DECORRENTES DA TÉCNICA INADEQUADA NO TRATAMENTO. ERRO MÉDICO CONSTATADO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CLÍNICA CONFIGURADA. DANOS MORAIS. VALOR FIXADO QUE ESTÁ EM DESACORDO COM O QUE VEM SENDO FIXADO POR ESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM CASOS SIMILARES. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO ARBITRADA. DANOS ESTÉTICOS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OS DANOS MORAIS. SÚMULA 387 DO STJ. CICATRIZES EM DECORRÊNCIA DAS LESÕES EM AMBAS AS PERNAS DO APELADO. EXAME PERICIAL QUE CONCLUIU PELA EXISTÊNCIA DE PREJUÍZO ESTÉTICO IMPORTANTE. NÃO CABIMENTO DA DIMINUIÇÃO DA INDENIZAÇÃO ARBITRADA. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJPR - 9ª Câmara Cível - 0002176-59.2021.8.16.0077 - Cruzeiro do Oeste - Rel.: DESEMBARGADOR ROBERTO PORTUGAL BACELLAR - J. 21.07.2024)
A decisão aborda a responsabilidade civil médica em casos de erro em procedimentos estéticos, especialmente quando há falha técnica que resulta em danos estéticos significativos. No caso em questão, o autor sofreu queimaduras e cicatrizes permanentes após um procedimento de cauterização química mal executado.
A perícia constatou a existência e extensão do dano estético, resultando na indenização de R$20.000,00.
A decisão também reafirma a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, devido à relação de consumo entre o paciente e o profissional, e a obrigação de resultado do médico.
A presunção de culpa do profissional foi mantida, visto que não houve comprovação de excludente de responsabilidade. Portanto, os tribunais brasileiros têm reforçado a importância da análise individualizada do dano estético, destacando que ele deve ser tratado de forma distinta dos danos materiais e morais, garantindo uma indenização adequada para as vítimas que sofrem alterações permanentes em sua aparência física.
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